1 Contexto Histórico

Para elucidar a história do cálculo variacional é importante mostrar um pouco da história dos máximos e mínimos de funções, problema pertinente ao cálculo diferencial, para, então, adentrar aos problemas de máximos e mínimos de funcionais, problema atribuído a área do cálculo variacional.

1.1 Máximos e mínimos

Os problemas de máximo e mínimo são corriqueiros na vida cotidiana, por exemplo, quando se quer encontrar o caminho com menor distância entre dois lugares para se caminhar uma menor distância, dentre vários outros problemas mais elaborados. Para esse exemplo específico não é necessário o uso de matemática avançada, porém, quanto mais complexidades são adicionadas aos problemas, mais ferramentas matemáticas são necessárias para a resolução, exata ou aproximada. Para simplificar estes processos, surgem os métodos para o cálculo de máximos e mínimos das funções.

Uma das primeiras formulações matemáticas próxima das atuais para os problemas de máximos e mínimos foi feita por Pierre de Fermat(1601 - 1665) em 1629 considerando curvas \(y=f(x)\). Ele fez comparações de \(f(x)\) e \(f(x+E)\), onde \(E\) é um número real positivo próximo de zero, ou seja, ele fez comparações do valor da função para pontos próximos. Esses valores geralmente são diferentes, porém, próximo de máximos ou mínimos a diferença se torna pequena. Deste modo, para achar os pontos de máximo ou mínimo, Fermat fazia \[ \frac{f(x+E)-f(x)}{E} \] e, após realizar a divisão, considerava \(E=0\). Após considerar o valor de \(E\) igual a \(0\), Fermat igualava a expressão obtida a \(0\), de onde conseguia extrair os valores das abscissas dos pontos de máximos e mínimos da função \cite{boyer}.

O que Fermat fez, de fato, foi igualar a primeira derivada de uma função a \(0\). É importante ressaltar que esse método utilizado por Fermat veio antes mesmo da invenção do cálculo diferencial por Isaac Newton(1642 - 1727) em 1665-1666 e Gottfried Wilhelm Leibniz(1646 - 1716) em 1676, de forma independente \cite{boyer}.

1.2 O cálculo variacional

O ponto de partida do cálculo variacional se deu com Johann Bernoulli(1667 - 1748), em 1696, com a publicação do problema da braquistócrona no jornal científico Acta Eruditorium \cite{hist_courant}.

O problema pode ser enunciado como: "Sejam \(A\) e \(B\) dois pontos dados em um plano vertical. O problema da braquistócrona consiste em encontrar a curva que uma partícula M precisa descrever para sair de A e chegar em B no menor tempo possível, somente sob a ação da força da gravidade" \cite[p. 3]{calcvar}.

O próprio Johann Bernoulli foi um dos matemáticos que solucionou o problema da braquistócrona. Ele retardou a publicação da sua solução para estimular os matemáticos do seu tempo a testarem suas habilidades nesse novo tipo de problema matemático \cite{hist_courant}. Além de Johann Bernoulli, soluções independentes foram encontradas por diversos matemáticos, como Jakob Bernoulli(1654 - 1705) (1697), L'Hospital(1661 - 1704) (1697), Leibniz (1697), e Newton (1697), \cite{hist_still}.

A solução de Jakob Bernoulli considerava o aspecto da curva variável, sendo considerado o primeiro grande passo para o desenvolvimento do cálculo variacional \cite{hist_still}. Nesse problema, a quantidade a ser minimizada depende de uma curva e não apenas de uma váriavel real \cite{hist_courant}, diferentemente dos problemas relacionados ao cálculo diferencial, o que torna necessária a construção de novas ferramentas matemáticas.

Os métodos para a resolução de problemas deste tipo eram específicos com adaptações para cada caso, sendo que os métodos gerais para a resolução só foram desenvolvidos com o envolvimento dos matemáticos Euler e Lagrange nos estudos desses problemas \cite{hist_courant}.

1.3 O método de Rayleigh-Ritz

O processo de minimização de funcionais envolve diretamente a resolução de equações diferenciais que, na maioria das vezes, pode não ter solução analítica. Uma forma de se contornar esse problema é o uso de soluções aproximadas e, com esse intuito, surge o método de Rayleigh-Ritz, fazendo o uso de funções admissíveis.

O método de Rayleigh-Ritz carrega o nome de dois pesquisadores, Lord Rayleigh(1842 - 1919) e Walter Ritz(1878 - 1909), porém seu desenvolvimento se deve, principalmente, a Walter Ritz, enquanto a solução apresentada por Lord Rayleigh é tratada como introdução, como será descrito abaixo.

Lord Rayleigh, em 1877, trabalhando com as energias potencial e cinética de sistemas, assumiu um padrão de vibração numa determinada frequência calculando a frequência de vibração livre por meio do equacionamento das energias potencial e cinética. Esse método ficou conhecido como método de Rayleigh e a sua precisão depende de quão próximo o padrão de vibração escolhido está do correto \cite{LEISSA_2005}.

Em 1908 e 1909, Walter Ritz publicou dois artigos descrevendo procedimentos simples para a resolução de problemas de valor de contorno e de autovalores numericamente para qualquer nível de exatidão necessário usando funcionais \cite{LEISSA_2005}. Esse procedimento foi chamado de método de Ritz.

Não se sabe exatamente quando o nome Rayleigh passou a ser agregado ao método de Ritz, transformando-se em "método de Rayleigh-Ritz". Uma das razões pelas quais isso ocorreu é o fato de que o método de Rayleigh pode ser considerado como um caso especial do método de Ritz quando uma única função admissível é utilizada para a aproximação \cite{LEISSA_2005}.

O método de Rayleigh foi utilizado frequentemente, porém, nas últimas décadas o método de Ritz ou, como é chamado hoje, de Rayleigh-Ritz se mostrou aplicável a uma gama enorme de problemas devido, principalmente, a revolução tecnológica promovida pelos computadores, a partir da invenção dos transistores e microprocessadores \cite{LEISSA_2005}.

1.3.1 Aplicações do método de Rayleigh-Ritz

O método de Rayleigh-Ritz possui aplicações nas mais diversas áreas sendo, porém, a análise estrutural uma das áreas em que o método é mais utilizado. Seu uso é empregado, principalmente, com o objetivo de encontrar as chamadas frequências naturais. As frequências naturais "indicam a taxa de oscilação livre da estrutura, depois de cessada [a] força que provocou o seu movimento. Em palavras similares, representa o quanto [a] estrutura vibra quando não há força aplicada sobre ela." \cite[p. 1]{Vasquez2015}.

\citeonline{RRM_Applications} exemplificam essa aplicação ao procurar as frequências naturais em um tipo específico de viga, chamada de consola, que é uma viga apoiada apenas em uma de suas extremidades. A Figura 1.1 mostra uma representação de uma viga desse tipo, onde a curva \(w(x,t)\) representa o deslocamento dinâmico. Diversos outros trabalhos trazem essa mesma abordagem ao método, visando analisar frequências naturais de vibração, como, por exemplo, o trabalho de \citeonline{mrr_beams}, que estuda a frequência natural de vigas seguindo o modelo de Timoshenko e de Euler usando o método de Rayleigh-Ritz. \citeonline{GROSSI_2001} mostra a aplicação do método à problemas envolvendo placas, ao invés de vigas.

Figura 1.1 - Modelo de uma viga consola vibrando.
Fonte: Adaptada de \citeonline[p. 23]{RRM_Applications}

Além da abordagem convencional do método, existem trabalhos que visam aliar o método à técnicas de inteligência artificial, como o aprendizado de máquina. \citeonline{deep_ritz} afirmam que modelos baseados em redes neurais profundas podem ser utilizados em tarefas como a resolução de equações diferenciais parciais ou a modelagem molecular. Além disso, o trabalho propõe um método chamado de deep Ritz method (método de Ritz profundo, em tradução literal) para a resolução de problemas variacionais. Esse método utiliza-se de representações de funções de redes neurais artificiais no contexto do método de Ritz \cite{deep_ritz}.

Um dos exemplos mostrados por \citeonline{deep_ritz} para ilustrar a eficácia da abordagem é a solução para a equação de Poisson em duas dimensões. A Figura 1.2 apresenta a solução utilizando dois métodos diferentes, sendo a Figura 1.2a a solução pelo deep Ritz method com 811 parâmetros e a Figura 1.2b a solução pelo método das diferenças finitas com 1681 parâmetros.

Figura 1.2 - Solução da equação de Poisson utilizando o deep Ritz method e o método das diferenças finitas.
(a) Solução pelo Deep Ritz Method.
(b) Solução pelo método das diferenças finitas.
Fonte: \citeonline[p. 5]{deep_ritz}

Os exemplos acima citados mostram tanto aplicações clássicas quanto uma aplicação moderna do método de Rayleigh-Ritz e serve, inclusive, como motivação ao estudo do tema.

1.4 A linguagem Python

A linguagem de programação Python foi criada por volta de 1990 por Guido van Rossum no Stichting Mathematisch Centrum nos Países Baixos \cite{Python_history}. Guido é o seu principal criador, porém, com o desenvolvimento open source, a mesma apresenta colaborações de diversas pessoas — atualmente, há cerca de mil colaboradores no repositório da linguagem no GitHub1. Em 2001, foi criada a Python Software Foundation, organização sem fins lucrativos, responsável por possuir a propriedade intelectual relacionada a Linguagem Python \cite{Python_history}.

As principais motivações para o uso da linguagem Python neste trabalho é o seu funcionamento simples, a facilidade de uso, grande comunidade de usuários, além do fato de ser uma linguagem de programação gratuita e de código aberto tornando-a, deste modo, acessível.

Além dos diversos colaboradores diretos no desenvolvimento da linguagem, existem os colaboradores indiretos que criam, por exemplo, os pacotes com funções prontas para o uso. Dentre os pacotes científicos mais conhecidos estão alguns do ecossistema SciPy:

Existem outros pacotes científicos no ecossistema do SciPy e, também, fora do ecossistema, porém, serão citados, aqui, apenas esses devido ao fato de que os seus usos são voltados para a matemática e aplicações.

A linguagem e ambos os componentes citados são desenvolvidos em código aberto de forma colaborativa. Uma das vantagens dessa forma de desenvolvimento é o rápido aperfeiçoamento de suas funcionalidades, documentação e, também, a rápida correção de erros.

settings